Não é possível negar que dois dos tópicos mais quentes da atualidade são a Inteligência Artificial (AI) e a Experiência do Utilizador (UX).
No momento em que este artigo é escrito, existem 66.684 e 58.769 cargos profissionais relacionados com a IA e UX, respetivamente, no Linkedin. Na Glassdoor, só nos Estados Unidos, existem 1.021 e 16.686 cargos associados à IA e UX.
Creio que os dados falam por si, mas de que forma estas disciplinas trabalham lado a lado? Será que podemos considerar que uma se baseia na lógica, focada na autonomia e na possível “desumanização” das soluções, e que a outra se baseia na emoção, cognição, estando totalmente centrada na experiência humana? Talvez seja lógico considerá-las incompatíveis. Este artigo irá explorar a relação que acredito vir a desenvolver-se entre IA e UX nos próximos anos, para criar melhores e mais valiosas soluções para empresas e marcas.
Ser ou não ser IA
À semelhança de qualquer nova tendência tecnológica, o seu primeiro instinto pode ser o de começar a experimentá-la imediatamente, ou até mesmo implementar uma estratégia IA o mais rapidamente possível, para ficar à frente da sua concorrência.
Antes de fazer o que quer que seja, precisa de compreender realmente se faz sentido avançar com alguma coisa, ou então engavetar a ideia para um momento posterior. A verdade é que a IA pode não ser a solução certa para a sua marca ou produto. Poderá nem estar preparada para resolver os problemas que deseja solucionar.
Recentemente pedi o parecer de um colega designer, que admiro e trabalha na área, e fui levado até este ótimo artigo escrito por Kathryn Hume no Harvard Business Review. Kathryn partilha excelentes conselhos e uma fórmula através do qual podemos analisar se existe ou não uma oportunidade de investir em IA.
Outro aspeto importante quando se tem a IA em consideração é o estágio de desenvolvimento em que a disciplina se encontra e como poderá evoluir nos anos vindouros. A equipa da Axiom Zen recentemente publicou um ótimo artigo que explica em termos muito simples e diretos onde a IA se posiciona e alguns aspetos da estrutura de base, cuja leitura vale totalmente a pena.
Resumindo: pense antes de dar o salto.
Seres humanos em comunicação com máquinas
Avançando para as aplicações verdadeiramente práticas da IA, e de como a UX pode ser um complemento perfeito, atentemos primeiro à comunicação entre os seres humanos e máquinas.
O título acima poderá, à primeira vista, implicar que somos nós, os seres humanos, aqueles quem necessitam de aprender a comunicar com máquinas para que estas reajam da maneira esperada. No entanto, gostaria de explorar a vertente de como as máquinas são capazes de compreender os seres humanos.
Atualmente, as máquinas têm ainda um longo caminho a percorrer antes de serem capazes de compreender o modo como os humanos falam tão facilmente e se compreendem entre si. O Processamento em Linguagem Natural (PLN), como é conhecido, é ainda influenciado pelo tom, pelas palavras com sons semelhantes mas significados diferente, pelas mudanças de assunto e muito mais. Neste artigo no The Economist, o autor explora a evolução do PNL ao longo dos anos, as suas atuais capacidades e o quão as máquinas necessitam de evoluir.
O papel da UX profissional será o de trabalhar lado a lado com os engenheiros para ajudar a “educar” as máquinas sobre as complexidades e nuances de como os seres humanos comunicam entre si. Tentando acrescentar empatia e traços “humanos” a sistemas que se baseiam na lógica e garantindo que o fator humano nunca é esquecido, em vez de forçar o homem a dialogar como máquinas.
Máquinas em comunicação com humanos
O lado reverso da comunicação entre humanos e máquinas é a forma como a máquina comunica connosco. Para os seres humanos, a forma como a máquina comunica connosco pode fazer toda a diferença na forma como ficamos maravilhados, frustrados, desconfortáveis ou simplesmente assustados. As subtis diferenças são tão mínimas que facilmente podemos cair num desses domínios e criar a mais incrível experiência ou então danos irreparáveis para uma marca.
Como mencionado no mesmo artigo do The Economist, muitos de nós poderão lembrar-se dos tempos em que as máquinas tinham uma voz mecânica, conforme exemplificado em muitos filmes (ex. 2001: Uma Odisseia no Espaço, O Exterminador Implacável, etc.), mas também vimos representações do lado oposto, quando as máquinas comunicam de uma forma bastante semelhante à dos seres humanos (por exemplo, Her, Ex Machina, etc.). Verdade seja dita, estes são filmes de ficção científica fantasiosa, que exploram o pior resultado possível para fins dramáticos, e que ajudaram na alimentação de muitos mitos em torno dos perigos da IA.
Olhando à analogia básica feita por estes filmes, se as máquinas parecem ser frias na compreensão dos seres humanos, ou se são muito semelhantes a estes, temos dificuldade em confiar nelas.
Uma vez mais, para criar a melhor experiência, precisamos de trazer a humanidade e a empatia para as máquinas, mas de uma maneira que irá manter o utilizador confortável e seguro, ao mesmo tempo que acrescentamos valor concreto.
Já vimos algumas experiências com robôs e assistentes pessoais, onde as máquinas tentam comunicar com os utilizadores. Nos exemplos mais bem-sucedidos, as máquinas informam o utilizador de que ela sãos, de fato, uma máquina. Se tal for bem executado, o utilizador adora as opções que uma máquina oferece, enquanto vai compreendendo que do outro lado não está um humano.
Onde pode e, muitas vezes, nasce o erro, é quando a máquina não é capaz de ajudar ou entender a pergunta, só porque ela não é expressa corretamente ou não contém palavras-chave reconhecíveis.
Nesta esfera, os profissionais de UX serão fundamentais para alinhavar a forma como estas situações são tratadas, de modo a reduzir o desconforto do utilizador.
Aumento UX
Até agora, temos explorado o impacto geral que a IA está a ter, como a UX pode ajudar na evolução da IA e, por fim, considerei também pertinente discutir as formas possíveis que permitirá à UX evoluir com a ajuda da IA.
Ao lermos o artigo de Kathryn Hume, o óbvio impacto surgirá quando algumas das tarefas banais que os profissionais de UX precisam de resolver forem tratadas pela IA, dando aos primeiros um insight que lhes permitirá criara uma solução. Tarefas repetitivas como análise de concorrência/de base ou uma análise analítica podem tornar-se automatizadas até certo ponto.
Indo mais longe, poderá valer a pena explorar a forma como a IA irá levar a UX até níveis superiores, aumentando assim as nossas capacidades atuais. Creio que estamos a caminhar para um futuro onde o profissional de UX terá mais tempo para se concentrar nos aspecto que só um humano pode fazer, recolhendo os frutos de ter um incrível poder computacional para filtrar e analisar objetivamente os dados.
Um exemplo interessante é a solução criada pela iMotions, que recorre à IA para agregar uma pesquisa biométrica a fim de facilitar a comparação e análise. Os dados da pesquisa são apresentados de uma forma que possibilita uma extração de insights mais simples, com os profissionais a serem capazes de se concentrarem simultaneamente em diversos recursos de pesquisa.
As soluções como aquela apresentada pela iMotions irão ajudar-nos a extrair dados quantitativos de uma pesquisa qualitativa, algo que nem sempre era simples no passado. Com objetividade e lógica, poderemos identificar padrões mais complexos e a necessidades do utilizador. Caberá então aos profissionais de UX aplicar a empatia e caraterísticas humanas a todos os insights obtidos. Quando executado corretamente, os UXers serão capazes de fazer mais com menos esforço, concentre-se mais nas vertentes emocionais, ficando livres para criar ainda um maior número de soluções inovadoras.
Conclusão
Seria excelente poder dizer a uma máquina para “projetar uma nova app para organizar a minha agenda”, por exemplo, mas a realidade é muito mais complexa. Apesar dos incríveis avanços que temos testemunhado, ainda não parece ser uma solução universal que “faz tudo” com um só clique.
A UX deve tomar parte ativa em ajudar a AI a compreender os seres humanos, fazendo com que as interações entre a IA e seres humanos sejam mais confortáveis para os utilizadores. Mas, mais do que isso, a UX também está pronta a colher os frutos de
sistemas em constante evolução, que apresentam soluções mais complexas, que se tornam elas mesmas um sistema com vida própria, mantendo uma interface intuitiva e uma interação com o utilizador simplificada.
Eu sugiro que os profissionais de UX comecem por entender onde as máquinas podem ajudar e onde eles, como UXers, precisa de aceitar a IA como parte dos seus trunfos, evitando focar-se apenas no negativo, encarando-a como algo que transformará os
sistemas em monstros frios, monótonos e calculados.
Na minha opinião, se queremos defender as necessidades do utilizador, temos de dar um passo em frente e garantir que a IA evolui na direção certa rumo a uma simbiose mutualística.